Em língua portuguesa, o aluno que está no 5º ano tem a mesma proficiência de um estudante do 3º ano do ensino fundamental. Para especialista, secretaria poderia ter investido mais no ensino remoto. Secretário admite que o ensino que ‘já era ruim, ficou pior’. Aluno participa de aplicação da prova do Saresp em São Paulo.
Secom/GOESP
Os alunos do 5º ano da rede estadual do ensino fundamental têm o mesmo nível de conhecimento em matemática do que os do 2º ano, de acordo com os resultados do Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (Saresp) divulgado nesta quarta-feira (2) pela Secretaria Estadual de Educação (Seduc-SP). É a maior queda da série histórica, iniciada em 2010.
As provas foram aplicadas em dezembro de 2021 para mais de 642 mil alunos do 5º e 9º anos do ensino fundamental e 3ª série do ensino médio da rede estadual.
Dentre as séries testadas, o 5º ano teve a maior queda em 2021. Em língua portuguesa, o aluno que está no 5º ano tem a mesma proficiência de um estudante do 3º ano do ensino fundamental.
Comparados aos números de 2019, anteriores à pandemia de Covid-19, o recuo foi de 8,5% – 216,8 para 198,2 – em língua portuguesa e 9,1% – 231,3 para 210,2 – em matemática, resultados semelhantes a 2012 e 2013, respectivamente.
Com pandemia, aluno do ensino médio de SP tem pior desempenho da série histórica; estudante sai com defasagem de seis anos
De acordo com a Secretaria da Educação, os resultados mostram um grande impacto na aprendizagem durante a pandemia. O próprio secretário da Educação de São Paulo, Rossieli Soares, admitiu que o ensino que “já era ruim, ficou pior”.
“Aquilo que já era ruim ficou pior. Estou usando uma frase que já foi muito publicizada para dizer que o ensino médio já estava no fundo do poço e a pandemia mostrou que podia piorar”.
O secretário falou que não tem previsão do tempo necessário para os alunos recuperarem a defasagem.
“A primeira solução que eu defendo de recuperação é voltar para a sala de aula e ficar em sala de aula com os alunos. Não pode ser o carnaval a prioridade do nosso país, tem de ser escola presencial, que é o principal lugar”, afirmou Soares.
O secretário de Educação do estado de São Paulo, Rossieli Soares, durante coletiva de imprensa nesta quarta (2).
Bárbara Muniz/g1
Soares afirmou que outros fatores também podem ter atrapalhado a aprendizagem dos alunos.
“Difícil afirmar que não houve outros fatores, alguns são não ter escola presencial e preparação para a prova. Mas o principal é ter aula presencial, o que faz uma falta absurda. Só voltamos presencialmente em novembro.”
O secretário afirmou que não sabe se o fato de não ter vinculado bônus pago a professores ao desempenho dos alunos pode ter influenciado no resultado da avaliação.
“Há outros fatores, como por exemplo, o Saresp pela primeira vez não foi considerado para pagamento de bônus e as escolas sabiam disso. A gente não sabe se isso influenciou. As tendências foram semelhantes em todos os estados, mas ainda vamos estudar as exceções.”
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Comparados aos números de 2019, anteriores à pandemia de Covid-19, o recuo foi de 8,5% – 216,8 para 198,2 – em língua portuguesa e 9,1% – 231,3 para 210,2 – em matemática, resultados semelhantes a 2012 e 2013, respectivamente.
Para o professor de políticas educacionais na Universidade Federal do ABC (UFABC) e integrante do grupo Rede Escola Pública e Universidade (Repu), Fernando Cássio, a secretaria podia ter investido no ensino à distância .
“Acho curioso a secretaria responsabilizar a pandemia e o fechamento das escolas para justificar esses resultados. Eles dizem que as escolas não podiam ficar fechadas, mas precisa ser lembrado que a Secretaria não viabilizou ensino remoto para os estudantes.”
Fernando cita a demora de quase um ano para a Seduc disponibilizar os chips para os alunos terem acesso à internet e acompanharem as aulas via aplicativo. Além disso, um levantamento do Tribunal de Contas do Estado (TCE) concluiu que pelo menos metade dos estudantes não acessou o aplicativo para acompanhar as aulas do ensino à distância.
“É evidente que a pandemia tem sua parcela, mas é uma forma fácil da secretaria se eximir da responsabilidade. Eles falam do fechamento das escolas como se isso fosse um fenômeno fora do controle da secretaria. Eles criaram todas as condições de segurança nas escolas? Eles ofereceram todas as possibilidades para os alunos manterem o vínculo com as escolas através das plataformas criadas? Parece que fizeram todo o possível e infelizmente por causa do fechamento das escolas e da pandemia temos esse resultado. É preciso assumir as responsabilidades. Inclusive se o objetivo é mitigar os efeitos da pandemia, é preciso antes de tudo reconhecer os próprios erros.”
Soares afirmou que forneceu dados patrocinados aos alunos para acesso ao aplicativo, além de canal no YouTube e na televisão aberta para acompanhamento das aulas. Nesses canais, porém, secretário afirmpu não ser possível aferir a quantidade de acessos.
“Eles também podiam assistir às aulas gravadas dentro do nosso repositório, então alguns assistiam no aplicativo, outros na televisão, outros no Youtube e sabemos que outros não assistiam. As escolas optaram por usar outras plataformas, não foi proibido às escolas de usar outras soluções. É um mix. Não dá para saber o tamanho disso, mas o que sabemos é que o maior canal de educação no Brasil no YouTube é o do Estado.”
Nível de aprendizagem do 5º ano tem maior queda da série histórica
Arte/g1
Recuperação
O secretário da Educação afirmou que todo o sistema sofreu “um grande impacto” com a pandemia. “Os professores sentiram desnível muito grande dentro da mesma sala, dependendo da família e do apoio recebido. Se você percebe que a família teve um apoio maior, ele teve menos perda. Não há nada escrito em pedra, estamos sempre repensando”, disse.
Dentre as estratégias para recuperação dos alunos, está a de redesenho dos materiais e aulas de recuperação.
“Foco no tempo de aula, e não só no contraturno, com 3 tempos de recuperação dentre as 5 aulas semanais de matemática. Vamos avançar com o currículo, mas vamos recuperar o básico feijão com arroz”, disse.
O governo disse que também vai apostar no programa “Aprender Juntos” já testado em 36 escolas no ano passado.
“É a possibilidade de reorganizar as turmas temporariamente as turmas para que eles possam fazer a recuperação de uma forma homogênea. Então por exemplo, se temos uma parte dos alunos que não aprendeu a diminuir e a outra a somar, podemos juntar de forma homogênea. É uma opção que a escola sempre vai ter e os professores têm sentido necessidade de fazer”, disse Rossieli.
Abaixo do adequado
A Secretaria Estadual de Educação dividiu a classificação de conhecimento dos alunos nas disciplinas avaliadas em: avançado, adequado, básico e abaixo do básico.
A pasta considera como abaixo do adequado a soma do número de estudantes que foram classificados com conhecimentos básicos e abaixo do básico.
No 5º ano, 51,4% dos alunos têm conhecimento abaixo do adequado em língua portuguesa. Em 2019, eram 35,9%.
Se considerarmos a média de proficiência dos alunos em língua portuguesa, a diferença entre as avaliações de 2021 (198) e 2019 (217), queda de 19 pontos no ano passado.
Em matemática, 61,6% dos alunos do 5º ano estão com conhecimento abaixo do adequado em 2021. Em 2019, eram 44,5%.
Se considerarmos a média de proficiência dos alunos em matemática, a diferença entre as avaliações de 2021 (210) e 2019 (231) teve um déficit ainda maior: 21 pontos.
9º ano
O 9º ano também sofreu com o impacto da pandemia na aprendizagem. 76,2% dos alunos registraram conhecimento abaixo do adequado em língua portuguesa em 2021. Em 2019, eram 69,6%.
Se considerarmos a média de proficiência dos alunos do 9º em língua portuguesa, a diferença entre as avaliações de 2021 (241) e 2019 (250) foi de 9 pontos.
Já em matemática, 85,7% dos alunos do 9º ano sabem abaixo do adequado. Um crescimento de 5,9 pontos percentuais se comparado a 2019, quando 79,8% foram avaliados com conhecimentos abaixo do adequado.
Considerando a média de proficiência dos alunos do 9º ano em matemática, a piora foi de 13 pontos. Passou de 260 em 2019 para 247 em 2021.
Avalição do nono ano no Saresp
Arte/g1
Exemplos de questões
A questão abaixo é um exemplo de conteúdo de matemática avaliado nos anos iniciais. Trata-se de uma conta simples de subtração. A habilidade exigida é resolver problemas que envolvam a adição ou a subtração, em situações relacionadas aos seus diversos significados.
Segundo o resultado da Saresp, 61,6% dos estudantes do 5º ano provavelmente não conseguiram realizar esta atividade.
61,6% dos estudantes do 5º ano provavelmente não conseguem realizar esta atividade, de acordo com a Saresp
Reprodução/Seduc-SP
Já a questão abaixo é um exemplo do conteúdo avaliado nos anos iniciais em língua portuguesa. A habilidade, no caso, seria identificar a finalidade de um texto, mobilizando conhecimentos prévios sobre o formato do gênero, tema ou assunto principal.
De acordo com o resultado da avaliação, 51,4% dos estudantes do 5º ano provavelmente não conseguem realizar esta atividade, ou seja, mais da metade dos alunos do 5º ano não consegue dado que eles possuem proficiência de terceiro ano:
51,4% dos estudantes do 5º ano provavelmente não conseguem realizar esta atividade, de acordo com resultado da prova Saresp 2021
Reprodução/Seduc-SP
“Identificar a finalidade de um texto. Isso é um dos conhecimentos mais básicos: ler um cartaz com uma mensagem de quatro linhas e identificar a função de um texto”, afirma Fernando.
“De fato é um quadro sério. Eles estão dando ênfase na pandemia, mas os indicativos já eram sérios, ruins e preocupantes. É evidente que as habilidades perdidas precisam ser recuperadas, mas é importante se responsabilizar pela não implementação das políticas educacionais tempestivamente.”
No 5º ano, 86,6% do total de alunos foram avaliados, contra 93,4% em 2019. No 9º ano, 83,1% foram avaliados em 2021 e 88,2% em 2019.
O Saresp 2021 também foi aplicado de forma amostral para estudantes dos 2º e 3º anos do ensino fundamental. Ao todo a aplicação envolveu mais de 5 mil escolas da rede estadual e mais de 2 mil escolas das redes municipal, particular, SESI e Centro Paula Souza.
Os resultados da avaliação de Ciências da Natureza não serão divulgados neste momento, segundo a Seduc-SP, pois a última avaliação foi aplicada em 2014 e com o currículo anterior; portanto, não há comparabilidade. Os resultados de redação e socioemocionais também ainda não foram divulgados.
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